quinta-feira, 22 de julho de 2010

Nove horas da manhã, já não tinha ninguém em casa. Levantou com o sono lhe puxando pra baixo. No espelho do banheiro via uma espinha enorme que ficaria ali por tempo indeterminado, claro. Banho? Não, agora não, está frio, poxa. Escovar os dentes? Sim, por favor! Pasta sabor menta. Mas menta não dá mau hálito? Que seja! Continuou com o pijama, óbvio. Quem lhe incomodaria em um dia tão monótono como aquele? Na cozinha, um copo de leite, antes tão comum, hoje não lhe agradava. Queria a Vodca. Para o café da manhã? Sim, por favor! O pão de ontem, hoje duro, lhe doeu às entranhas. Foi empurrada goela abaixo, afinal. No corredor, avistou o quarto da irmã. Dentro deste, avistou seu closet. No closet, avistou um vestido. Deveria? Por que não? Vermelho, justo, decotado, costas abertas. Foi mais que automático que o tecido lhe passasse pelo corpo e em pouco tempo lhe cobrisse. Não roubava, experimentava por instantes. Rodou com um desconcerto razoável por entre os cabides do closet. Encontrou um salto XV. Encontrou outro tão bonito quanto que ficou apertado no seu pé, obviamente. Mas não era problema, calçaria assim mesmo. Mesmo que por instantes. No banheiro do mesmo quarto, encontrou a bolsa de cosméticos de sua linda irmã. Seus dedos foram ágeis, puxaram o lápis de olho, o rímel, o blush, o pó compactor. E a sombra, então, amarela e verde. Deliciava-se com uma maquilagem exuberante (ou extravagante?). Ah! As bijuterias! Colares, brincos, pulseiras, anéis. Eram todos os enfeites sobre si.
Olhou seu corpo totalmente estranho ao espelho. Não se reconheceria se não soubesse que era quem era. Olhou para o relógio sobre o criado mudo do quarto feminino. 11:35. Ih! Tarde demais. Foi o tempo de virar seu corpo desajeitado para ver a porta do quarto abrir-se e a figura corpulenta de seu pai, junto ao corpo esguio de sua mãe, contendo ainda a presença dos olhos da irmã. Todos fitavam o mesmo ponto: a figura estranha, adornada! E foi a voz da jovem que quebrou o silêncio e o constrangimento:
- O que é que tem? Ele só acordou meio... sei lá.